quinta-feira, 30 de abril de 2009

quarta-feira, 29 de abril de 2009

sábado, 25 de abril de 2009

Somos livres



Quando eu era menino e começava a ver o mundo, as espingardas tinham sido desprovidas de balas mortíferas e munidas de perfumadas flores de cores vivas.
Ia ser um mundo novo, livre e justo, e a esperança estava depositada em nós, pois seríamos a primeira geração a crescer em democracia.
Mas não foi.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Conselho (II)


Conselho

Sê paciente; espera
que a palavra amadureça
e se desprenda como um fruto
ao passar o vento que a mereça.
.......................
................................Eugénio de Andrade

terça-feira, 21 de abril de 2009

... sonho de um porto infinito...


...........................................IV

Que pandeiretas o silêncio deste quarto!...
As paredes estão na Andaluzia...
Há danças sensuais no brilho fixo da luz...
.....................
De repente todo o espaço pára...
Pára, escorrega, desembrulha-se...
E num canto do tecto, muito mais longe do que ele está,
Abrem mãos brancas janelas secretas
E há ramos de violetas caindo
De haver uma noite de Primavera lá fora
Sobre o eu estar de olhos fechados...
....................
Fernando Pessoa

quinta-feira, 16 de abril de 2009

imitatio

É claro que nos comportamos imitando, ao longo de todas as décadas das nossas infâncias. Começamos por imitar os outros e passamos a imitar-nos, a nós próprios, quando tentamos seguir uma linha de coerência. Consciente ou inconscientemente, norteamo-nos (ou orientamo-nos) pelos faróis modelares que vamos encontrando na navegação à vista a que chamamos vida. É por isso que, enquanto pais e educadores, sem deixarmos de ser nós, temos a obrigação de encarnar as personagens certas nos momentos fulcrais das vivências experienciais das nossas crianças e dos nossos adolescentes. Já o sabia enquanto professor e estou a aprendê-lo como pai. E não é nada fácil...

*Hoje, apeteceu-me assinalar a capicua que este post é (111), não por imitação, mas por a Lady Godiva, no seu Mar Aberto, nos ter recentemente relembrado a beleza de certas combinações numéricas ou morfossintácticas.

Dia Mundial d' A Voz

domingo, 12 de abril de 2009

Wish you were... - IV


Com um sinal sonoro, apagou-se a luz que obrigava ao uso do cinto de segurança e imediatamente se assistiu à movimentação do pessoal de bordo, logo seguido pelos passageiros mais impacientes. Noutra época, seria o momento de acender o cigarro que o ajudaria a libertar-se da tensão acumulada na última meia hora. Mas essa luzinha continuava ligada e assim iria manter-se.
Agora, a onze mil metros de altitude, sentia-se descontrair e começava a prestar atenção ao que o circundava. A turística do Jumbo estava praticamente repleta – mais de 500 almas cruzavam o Atlântico em direcção às Antilhas, atrás do Sol que teimava em declinar. As oito horas de viagem para percorrer cinco fusos horários provocam necessariamente jet lag, mas esse problema nunca o afectara em demasia, o que o aterrorizava eram as descolagens e as aterragens. Sempre que pensava nisso, tropeçava numa das muitas ironias da sua vida, pois, quando jovem adolescente, sonhava vir a ser piloto.
Já eram muitas as pessoas que circulavam ao longo das duas intermináveis coxias da cabina, como se passeassem num centro comercial climatizado, enquanto lá fora a temperatura, segundo os ecrãs, quase atingia os cinquenta graus negativos. No meio daquela multidão, as hospedeiras tardavam em aparecer e ele precisava de comer qualquer coisa que lhe ensopasse o uísque que ingerira no processo de anestesia para o voo e que lhe provocara o forte hálito alcoólico com o qual sabia poder incomodar quem o rodeasse. Foi pensando nisso que, de boca bem fechada, atentou na vizinha do 9E, a qual, ao sentir o seu olhar, lhe respondeu com um breve sorriso, antes de mergulhar novamente no livro aberto sobre a sua mão esquerda. Só agora reparava na discreta beleza da companheira de viagem que o destino lhe reservara.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

domingo, 5 de abril de 2009

A minha praia

A minha praia, ontem à tarde, falava assim... e, no meio da nossa conversa, pediu-me para falar também convosco!

sábado, 4 de abril de 2009

Wish you were... - III


Foi o último passageiro a entrar no avião.
Olhou pela primeira vez para o número que lhe calhara no check in: 9D. Pelo menos, tivera a sorte de ficar na parte da frente e de ocupar uma coxia - detestava sentar-se à janela. Procurou o seu lugar, que não tardou a encontrar, e, olhando sem ver, balbuciou um quase imperceptível «Excuse me!» dirigido à ocupante do 9E, sentando-se imediatamente sem esperar por qualquer anuência. Queria apenas apertar o cinto e fechar os olhos até se completarem a descolagem e a vertiginosa subida até ao patamar de cruzeiro.
Ela, sem tirar os olhos do livro que não lia, ainda esboçou uma tentativa de resposta mas já não foi a tempo. Sentiu imediatamente a tensão do seu novo vizinho, transpirada no cheiro a uísque e na crispação com que os dedos se cravavam nos joelhos parecendo quererem arrancar-lhes as rótulas. Os seus olhos continuaram a percorrer as linhas do livro aberto como quem segue o caminho de um desses labirintos quebra-cabeças.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Wish you were... - II


Depois da costumeira confusão na arrumação das bagagens de mão por cima das respectivas cabeças, esta nova revoada de passageiros lá começara a acomodar-se nos atribuídos assentos. O avião estava já quase cheio, mas o lugar ao seu lado continuava vazio.
Abriu o livro na página marcada e passeou o olhar pelas linhas de texto sem atentar no que estava escrito. As palavras que lhe soavam chegavam da memória de outra leitura, da da carta que segurava entre os dedos e que lhe servira como marcador para as páginas agora abertas do encadernado companheiro para a viagem: "tendo esverdeado a minha alma com o teu aroma refrescante e deixado o teu verde salpicado de cores garridas..."
Estas palavras, intensas, não a deixavam, desde que as lera, tiradas da caixa do correio, no preciso momento em que saía de casa para o aeroporto. Fora surpreendida pela mais bela carta de amor que alguma vez recebera, não por ele lha ter escrito e enviado mas por a sua chegada ter coincidido com a partida para a longa viagem, instrumento da fuga ao mais belo e mais impossível dos seus relacionamentos amorosos. O seu último encontro tinha sido o mais intenso de todos; nele, os seus corpos e as suas almas tinham efectivamente sido sujeitos a uma comunhão tal que as cores de cada um se misturaram com as do outro, como se fossem plantas de um mesmo canteiro enrodilhadas por uma brisa doce e carregada de sal marinho.
Por isso, as palavras a não deixavam, por ter sentido exactamente o que elas traduzem. Nunca vivera um amor tão belo, tão intenso e tão impossível. Por isso, fugia dele. Por isso, estava agora sentada entre as asas que a levariam para longe, para muito longe da terra em que deixava a vida que não podia ter. Por isso, sentia que, por muito que fugisse, nunca iria deixar de o amar.