domingo, 11 de janeiro de 2009

Shalom

Abro hoje uma excepção na linha editorial deste blogue para falar da Palestina.
Nunca foi minha intenção erigir aqui qualquer tribuna política. Aliás, partilho cada vez menos e cada vez com menos pessoas as minhas opiniões sobre o caminho para que estamos a conduzir este nosso mundo. Mas tenho de dizer alguma coisa sobre mais este massacre em Gaza.
Não me considero anti-semita, mas não é por receio de mo chamarem que vou deixar de ter opinião sobre aquilo que os israelitas (não os judeus) estão a fazer: puro genocídio. É uma espécie de "solução final" à maneira do século XXI: planificada ao pormenor, tanto nos métodos como nos timings ou nos alvos. Quando, por exemplo, se oblitera uma escola e o "seu conteúdo", já nem sequer se fala nos politicamente correctos «danos colaterais», pois o alvo é apresentado objectivamente como a própria escola, que era preciso arrasar porque havia suspeitas de lá permanecerem não se sabe bem se "terroristas" ou "armas de destruição massiva" ou qualquer outro papão ou ogre ou espantalho a necessitar de ser primeiro 'agitado' e depois destruído para que os que foram assustados com a sua revelação possam dormir descansados depois do seu desaparecimento.
Apetecia-me dizer que já não precisamos que nos inventem papões para comermos a sopa, mas, infelizmente, olhando à volta, vejo os meus pares a comerem a sopa enquanto, cada vez mais assustados, vão acreditando nos papões e, cada dia mais convencidos do seu alívio, exultando com as notícias dos exorcismos bem sucedidos.
«Que chatice! Acabem lá com esses gajos, se não ocupam-me o telejornal todo e não deixam espaço para as verdadeiras notícias. Já deram as imagens do Ferrari do Cristiano Ronaldo destruído no túnel? Sabias que o gajo vai ter de trabalhar quinze dias para comprar outro? Aquilo é que é qualidade de vida. Outra notícia de merda! Se não são os árabes, são os pretos. Matem esses gajos todos de uma vez!»
É esta a mentalidade dos da minha geração, dos pais dos meus alunos, enfim, de muita gente - para não me comprometer com um talvez exagerado (?) "da maioria".
Estão a matar gente igual a nós, estão a matar-NOS, e 'zapamos' para outro canal.
Atrevo-me a dizer que cada um de nós, quando finge que não vê, está a ser tão criminoso como um general israelita.
"Pedi" a foto emprestada ao CM.

5 comentários:

Clarice disse...

Olha Vítor, para alguns não é fingimento, são cegos mesmo!

E nós estamos num mundo assim, de visão reduzida!

Anónimo disse...

Cheguei aqui à boleia
(vim 'de barco')
...Nem sequer sei quem és...é só para dizer que me soube bem "encontrar" mais alguém que se 'inquieta'... não consigo perceber a 'distração' de (quase) todos à minha volta

Vítor disse...

clarice:
pois estamos, e não é (ainda) a "cegueira branca"!...

anónimo:
benvindo a este porto meridional... quem sou e quem és poderá ser menos importante do que saber quem somos.
Volta sempre

Guida Palhota disse...

Vivam as fugas a linhas editoriais. E as expressões de opinião. De mais do mesmo não precisamos. Quem repara no que já (re)viu antes?! Venha a diferença e, sobretudo, venham as manifestações de indignação - tão fora de moda!
Obrigada por este teu grito ao 'mundo', pelo menos a este, que o nosso pequeno (?) grupo vai sendo...
Julgo que nenhum de nós estará menos afrontado do que tu, mas só tu sentiste necessidade de extravasar esse afrontamento, ou só tu o fizeste.
Ora ainda bem que não calaste a tua revolta perante estas atrocidades e perante a indiferença dos indiferentes!

Não posso, contudo, concordar contigo quando "nos" colocas o rótulo de 'criminosos' na testa, à conta de, por vezes, fingirmos que não vemos. Porque muitos dos que consideras indiferentes não passam de tristes impotentes, quer para fazer quer para dizer quer para ambas as coisas; e outros estarão demasiado fragilizados pelas exigências dos seus quotidianos.

Houvesse instrução capaz e possibilidade de fazer render o ócio e teríamos, facilmente, um mundo mais tolerante - porque existiria capacidade de diálogo, espírito crítico e uma noção clara da pouca importância de cada um de nós no cômputo geral.

Não partilhar constrangimentos parece-me uma forma perigosa de "encher" - talvez exactamente o que, na base, atinge a humanidade, com cada ser fechado sobre si mesmo a congeminar projectos egoístas que o levarão à solidão ou ao crime. Facilmente nos transformaremos em bombas perigosas, capazes de explodir, em momentos de necessidade de afirmação, se não aprendermos a dialogar...
Façamos alguma coisa pela capacidade de diálogo dos nossos alunos, uma vez que aos seus pais já chegaríamos tarde... Reconheço a apatia reinante em muitos deles, mas talvez consiga perdoar a maioria - pela massificação a que terão estado sujeitos desde que vieram ao mundo, o que fez deles "seres em banda"...

Quem é que está, afinal, "a conduzir este nosso mundo"? Estamos incluídos, certo?! Então sejamos interventivos (como tu aqui foste, mas ainda muito mais!)

Parabéns por teres feito um rasgão na tua publicação e obrigada por teres considerado que nós merecemos conhecer a tua posição sobre a NOSSA 'morte anunciada'...

Desculpa o longo comentário (?). Aproveitei o ensejo para "falar". Tivesse o mundo inteiro a mesma possibilidade... ou vontade!!!

Vítor disse...

margarida:
só me dei conta do tamanho do teu comentário quando a isso te referiste mas não o acho longo, até porque se sente que tens mais para dizer. Escreve o que quiseres e quanto quiseres. Quero que este seja um espaço de liberdade, quero que quem me visita se sinta livre, pois só assim me sentirei também plenamente livre.
Considerar-nos criminosos por olharmos para o lado foi, como disse então, 'atrevimento', mas também - e agradeço-te a "correcção" - exagero. É que, apesar de tudo, ainda não perdi o hábito de 'esticar a corda', chocando os outros com exageradas e, por vezes, radicais considerações, com as quais pretendo, acima de tudo, obrigá-los a reagirem e a pensarem nos assuntos, incomodados pelas minhas palavras. Uma ferroada bem dada por um moscardo pode fazer estourar a manada. E bem necessitados vamos estando de nos despertarem deste bovino remanso em que nos temos vindo a acomodar.
Obrigado por vires e comentares.