22 De pé, no meio do Areópago, Paulo disse, então:
«Atenienses, vejo que sois, em tudo, os mais religiosos dos homens. 23 Percorrendo a vossa cidade e examinando os vossos monumentos sagrados, até encontrei um altar com esta inscrição: ‘Ao Deus desconhecido.’ Pois bem! Aquele que venerais sem o conhecer é esse que eu vos anuncio.»
Act. 17, 22
Ignoto Deo
(D. D. D.)
Creio em ti, Deus; a fé viva
De minha alma a ti se eleva.
És: - o que és não sei. Deriva
Meu ser do teu: luz... e treva,
Em que - indistintas! - se envolve
Este espírito agitado,
De ti vêm, a ti devolve.
O Nada, a que foi roubado
Pelo sopro criador
Tudo o mais, o há-de tragar.
Só vive do eterno ardor
O que está sempre a aspirar
Ao infinito donde veio.
Beleza és tu, luz és tu,
Verdade és tu só. Não creio
Senão em ti; o olho nu
Do homem não vê na terra
Mais que a dúvida, a incerteza,
A forma que engana e erra.
Essência! a real beleza,
O puro amor - o prazer
Que não fatiga e não gasta...
Só por ti os pode ver
O que, inspirado, se afasta,
Ignoto Deo, das ronceiras,
Vulgares turbas: despidos
Das coisas vãs e grosseiras
Sua alma, razão, sentidos,
A ti se dão, em ti vida,
E por ti vida têm. Eu, consagrado
A teu altar, me prostro e a combatida
Existência aqui ponho, aqui votado
Fica este livro - confissão sincera
Da alma que a ti voou e em ti só spera.
Garrett, Folhas Caídas
Ignoto Deo
Que beleza mortal se te assemelha,
Ó sonhada visão desta alma ardente,
Que reflectes em mim teu brilho ingente,
Lá como sobre o mar o sol se espelha?
O mundo é grande – e esta ânsia me aconselha
A buscar-te na terra: e eu, pobre crente,
Pelo mundo procuro um Deus clemente,
mas a ara só lhe encontro... nua e velha...
Não é mortal o que eu em ti adoro.
Que és tu aqui? olhar de piedade,
Gota de mel em taça de venenos...
Pura essência das lágrimas que choro
E sonho dos meus sonhos! se és verdade,
Descobre-te, visão, no céu ao menos!
Antero de Quental, Sonetos
IGNOTO DEO
Desisti de saber qual é o Teu nome,
Se tens ou não tens nome que Te demos,
Ou que rosto é que toma, se algum tome,
Teu sopro tão além de quanto vemos.
Desisti de Te amar, por mais que a fome
Do Teu amor nos seja o mais que temos,
E empenhei-me em domar, nem que os não dome,
Meus, por Ti, passionais e vãos extremos.
Chamar-Te amante ou pai... grotesco engano
Que por demais tresanda a gosto humano!
Grotesco engano o dar-te forma! E enfim,
Desisti de Te achar no quer que seja,
De Te dar nome, rosto, culto, ou igreja...
– Tu é que não desistirás de mim!
José Régio