domingo, 12 de abril de 2009

Wish you were... - IV


Com um sinal sonoro, apagou-se a luz que obrigava ao uso do cinto de segurança e imediatamente se assistiu à movimentação do pessoal de bordo, logo seguido pelos passageiros mais impacientes. Noutra época, seria o momento de acender o cigarro que o ajudaria a libertar-se da tensão acumulada na última meia hora. Mas essa luzinha continuava ligada e assim iria manter-se.
Agora, a onze mil metros de altitude, sentia-se descontrair e começava a prestar atenção ao que o circundava. A turística do Jumbo estava praticamente repleta – mais de 500 almas cruzavam o Atlântico em direcção às Antilhas, atrás do Sol que teimava em declinar. As oito horas de viagem para percorrer cinco fusos horários provocam necessariamente jet lag, mas esse problema nunca o afectara em demasia, o que o aterrorizava eram as descolagens e as aterragens. Sempre que pensava nisso, tropeçava numa das muitas ironias da sua vida, pois, quando jovem adolescente, sonhava vir a ser piloto.
Já eram muitas as pessoas que circulavam ao longo das duas intermináveis coxias da cabina, como se passeassem num centro comercial climatizado, enquanto lá fora a temperatura, segundo os ecrãs, quase atingia os cinquenta graus negativos. No meio daquela multidão, as hospedeiras tardavam em aparecer e ele precisava de comer qualquer coisa que lhe ensopasse o uísque que ingerira no processo de anestesia para o voo e que lhe provocara o forte hálito alcoólico com o qual sabia poder incomodar quem o rodeasse. Foi pensando nisso que, de boca bem fechada, atentou na vizinha do 9E, a qual, ao sentir o seu olhar, lhe respondeu com um breve sorriso, antes de mergulhar novamente no livro aberto sobre a sua mão esquerda. Só agora reparava na discreta beleza da companheira de viagem que o destino lhe reservara.

15 comentários:

Clarice disse...

Ui, cheira-me que vai haver algum 31, com vizinha do 9E... 31, é como quem diz... a não ser que o rapaz que queria ser piloto, abra a boca... mas olha que mesmo com um forte hálito alcoólico, tudo pode acontecer... dizem...:)

* vá, toca a nadar com isto para a frente, agora estou a ficar nervosa!!!:)

Clarice disse...

errata: nadar não, seria mau sinal, essa palavra passar pela cabeça de quem vai num avião... ANDAR queria eu dizer!

beijos (e então, ele olhou mais para ela?:)ai meu deus!:)

Vítor disse...

Cheira-te? E estás nervosa? Então, se calhar, também vais naquele avião para as Antilhas... e agora estás a espreitar por entre os bancos para ver se ele olha para ela. És danada!

Clarice disse...

Vítor... tu és bruxo ou quê? sim, já espreitei, neste momento estou bebaixo do banco 9E... ganda bronca!:)
Mas quem manda no enredo és tu, leva-me para o meu lugar, please! Ainda por cima acho que ao meu lado está alguém a ler um livro... coisas do destino...

Vítor disse...

Bruxo, não; aprendiz de feiticeiro, só. Daqueles que geralmente desatam a fazer asneiras quando pensam que já dominam a arte. Mas realmente tenho uma certa capacidade de adivinhação; só não acerto na lotaria.

Eu não mando em enredo nenhum. Se estás a bordo, talvez fosse melhor contares tu a história - um narrador participante é sempre mais interessante. Pelo menos pode dizer: «Eu vi, eu estava lá».

Clarice disse...

Bem, sendo assim, e como gosto muito de livros... vou até ao meu lugar...
sempre me fascinou uma página aberta por perto... mas por favor, não faças como eu, nada de espreitadelas nem "passeios" por baixo dos bancos... nem sei se conseguias... eh,eh,eh


*eh pá,será que ele olhou mais para ela? esta não me sai da cabeça... :)

Guida Palhota disse...

Meninos:
Pensavam que eu estava distraída, era? Nah!
Nem perceberam que eu também viajava num dos 9?!
Ah, seus perversos! Só a repararem em quem bebe um alcoolzito e depois espreita meninas bonitas, para, logo a seguir, inventarem romances! Olhem que nem só do álcool surgem as histórias de enamoramento...
Pois eu, que estava lá, claro, vi, claramente visto (porque o som do forte ronco me fez olhar naquela direcção!), que o indivíduo já nem teve tempo de receber, das mãos da lourinha da tripulação, a dose de comida que lhe ensoparia o uísque. Porque o uísque o ensopou a ele e o fez mergulhar, logo após a troca de olhares com a vizinha, num sono profundo e relaxado. Tão relaxado quanto capaz de se fazer anunciar a todas as 500 almas que cruzavam o Atlântico...

Vítor disse...

Bem, afinal vai toda a gente neste avião menos eu.
Eis que surge outra narradora assumidamente participante - até "vê, «claramente visto»"!...
Força, menina Margarida, conte lá o resto da história do "Super Ronco", pois «Arrepiam-se as carnes e o cabelo,\
A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo!»

Clarice disse...

Olá Margarida! eu bem me parecia que tinha visto os teus pézitos...:)

Então não me digas que o outro adormeceu!
Eu estava a achar isto bom demais... é sempre assim... :( acho que vou fechar os meus olhinhos e imaginar como seria se o sono não chegasse...

Há histórias assim, ele não sabe o que perde, ela saberá o que ganha, neste caso não ser olhada por quem não vence o sono! Ou não é nada disto e é tudo ao contrário, ou tudo pode ainda acontecer na vida, ai, na viagem, queria eu dizer?

Vá continuem lá, antes que eu adormeça (mentira!)

Vítor disse...

Lá tenho de me dedicar aos petiscos outra vez!
Fiquem à vontade, miúdas. Vão pedindo que eu vou servindo. Volto já, vou buscar um barril de cerveja.

Clarice disse...

Isso Vítor, bem geladinha uma cerveja agora ía que nem ginjas! Mas onde é que ela se meteu, a Margarida? Se a vires... ela que esteja atenta ao sono do outro... :)

Guida Palhota disse...

Outra vez a pensarem que eu ando distraída?! Mas, afinal, por quem me tomam?!...
Estou aqui sentadinha a topar tudo. O filme já vi e sono não sinto...

Quanto ao Adamastor, tenho um ligeiro palpite de que só acordará quando o avião estiver a aterrar, mas não vou assumir-me como narradora... porque, se o homem vem a saber, ainda me arrisco a represálias; e porque narrador já nós temos, não vamos agora armar-nos aos cucos! Portanto, eu vi, eu estou cá, mas sou (apenas) personagem.

A cervejola não me parece mal, desde que "estupidamente gelada" e apenas uma, pois, quando for para aterrar, aterro querendo sentir tudo - nem que seja o medo! Não preciso cá de anestesias!

Clarice, vai para o teu lugar. Como é que queres tomar a cerveja aí escondida a cuscar?!

Vítor disse...

Ora então estão a sair 3 imperiais... (sim, que isto que tenho por baixo do nariz não é uma ferida, é uma boca; e do lado de cá do bar também se aprecia uma geladinha)

Wish you are happy in my bar!
I am happy to have you both as my guests, so happy that I'm going to ring the 'Happy Hour' bell!...

(O Adamastor, a esta hora, já deve estar bem 'fumado' lá no Jardim de St.ª Catarina! Deixem o homem em paz! Já lhe basta o castigo que os deuses lhe impuseram...)

Clarice disse...

Já estou sentadinha, mas há tantas horas!

Olha lá Vítor, isto vai para onde, sabes há quantas horas estamos no ar?

Ai meu deus, e o Adamastor (não)respira? ou dorme?

Sai outra gelada para mim, por favor!

Aníbal Meireles disse...

"Ssssssshhh"

"Senhores passageiros, daqui fala o vosso comandante Aníbal Meireles"

"Bem-vindos a bordo do Cátia Vanessa."

"Está um belo dia de sol lá fora, estamos a muitos pés de altitude e continuaremos a voar ligeiramente para cima, enquanto não descermos, e em frente, enquanto não fizermos nenhuma curva mais apertada, de modo a que eu não adormeça com a monotonia de pilotar esta geringonça.

Se eu pudesse pelo menos espreitar o belo sorriso da moça... mas não me posso ausentar porque o co-piloto é zarolho e portanto nunca fiando."

"Tenham um bom resto de vôo!"

"Ssssshhhhh"


P.S. Boa prosa Sr. narrador Vítor!